quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O POVO GUARANI E A TERRA SEM MAL


Guaranis (Foto: Leandro Quadros)



Um dos maiores especialistas na cultura Guarani, Bartolomeu Meliá, afirma que a busca da Terra Sem Mal é o motivo fundamental e razão explicativa da migração desse povo. A Terra Sem Mal é essencial para a construção do modo de ser guarani[1], pois é nela que vão encontrar a paz e a fartura.
Vestígios arqueológicos mostram que os guarani ocuparam sempre regiões férteis para o cultivo de milho, mandioca, vários tipos de feijões, abóbora, batata e amendoim. A vida guarani está associada à terra, que os obriga a adaptarem-se, criando as condições de povoamento, afetando a dimensão das aldeias e a densidade demográfica. Mas, a terra para essa cultura não significa apenas um meio de produção, ela se identifica com a Tekoha, que é um espaço sócio-político que possibilita o modo de ser guarani. Essa estrutura é composta por três espaços: da caça e pesca, do cultivo e da residência. Para o guarani a terra não é uma deusa, mas está impregnada de religiosidade e isso se verifica em seu pensamento mítico e seus rituais. A terra é o suporte fundamental para a economia de reciprocidade guarani e assim como existe uma concepção de terra perfeita, também há a consciência da instabilidade dessa terra, cujo desequilíbrio começa no desgaste ecológico originado pelo tipo de agricultura praticada pelo guarani, que é o roçado, que com o tempo os obriga a abandonar as terras cansadas e buscar outras novas.
No período colonial, esse espaço guarani foi afetado e modificado e a alternativa de fuga para novos lugares se tornou cada vez mais difícil. Hoje em dia, o grupo usa da imaginação para recriar espaços ecológicos semelhantes aos tradicionais para preservar a sua tekoha, que lhes assegura a liberdade e a possibilidade de manter a identidade étnica. A busca da Terra Sem Mal, do solo onde os guarani podem viver seu modo de ser autêntico, esbarra em interesses econômicos e especulativos e no desinteresse governamental de criar políticas públicas de proteção às culturas indígenas brasileiras. O grupo guarani, especificamente, necessita dessa mobilidade para assegurar sua identidade cultural e a demarcação de terras apenas os confina territorialmente, privando-os de manterem sua organização social tradicional. Eles estão conscientes da inexistência de outra alternativa, mas precisam que pelo menos suas terras sejam reconhecidas para assegurarem a sobrevivência cultural do grupo.



[1] MELIÁ, Bartolomeu. La Tierra-Sin-Mal de los Guaraní: economia y profecia. América Indígena. Vol.XLIX, n.3, México, Jul-Set, 1989, p.491.

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